O tempo no isolamento no espaço familiar - te favorece ou te devora?

Mas o que quer dizer este poema? - perguntou-me alarmada a boa senhora.

E o que quer dizer uma nuvem? - respondi triunfante.

Uma nuvem - disse ela - umas vezes quer dizer chuva, outras vezes bom tempo...

Mario Quintana




A genial escritora infantil Sylvia Orthof escreveu um livro que é muito significativo para mim, "Mudanças no galinheiro, mudam as coisas por inteiro".O sol amanhece gripado e pede que a lua o substitua em atribuições que não são de sua alçada. Um alvoroço no céu e muitas confusões na Terra.

Meu filho é era bem pequeno, menos de 3 anos e adorava que contasse, por várias vezes e dias seguidos, essa história meio maluca, bem a cara da Sylvia. Era tanta intimidade que ele já a chamava somente pelo primeiro nome.

Muitos desacontecimentos nesse período de isolamento, mudanças bruscas nos galinheiros de todos nós. Precisamos nos ocupar de lugares nunca antes experimentados. Tarefas domésticas, ensinar aos filhos o dever de casa, muitas vezes ensinar o conteúdo que não está sendo assimilado devido ao enfraquecimento das relações pelo modo online, Além das tarefas que já nos eram bem trabalhosas, no dia a dia.

"O Sol está gripado. não pode trabalhar hoje.", assim começa uma reorganização no mundo Orthof, bem parecido com os dias que estamos vivendo. O leite é derramado, o galo para de cantar, já que não tem mais amanhecer. Fica atordoado e a galinha passa a mandar no galinheiro, já que não tem galo para cantar de galo, é claro.

E nós? Vamos chorar o leite derramado ou limpar a sujeira?

A nossa maneira, realisticamente, vamos tentando manter a ordem no galinheiro. Ou melhor, a ordem em nossas casas. Nem sempre da melhor forma possível, pois muitas vezes o fato é que não conseguimos estabelecer as prioridades e não sabemos lidar com o tempo.

Priorizar, colocar em primeiro plano, nos salva dos arrependimentos de não saber lidar com tempo.

Tudo isso vai passar, isso é a impermanência das coisas, como disse o filósofo Heráclito há mais de 2500 anos, "Tudo flui, nada permanece."

E se tudo passa, como passar por tudo isso sem que o tempo seja apenas tempestade, sem chances de calmaria quando passar? 

Como fazer passar o tempo em casa, com filhos e atribuições que nos são impostas ou jogadas como ao abrir um armário lotado e todo seu conteúdo cai em nossas cabeças?

 A resposta é individual, mas o fato é que ou cuidamos do tempo ou o tempo nos devora. Essa gulodice do tempo se chama PROCRASTINAÇÃO. Seria melhor sairmos do isolamento melhores do que entramos,não empurrando com a barriga o que precisamos fazer agora. Não é hora de adiar, ao contrário, é hora de aproveitar melhor o tempo da pausa para os que não podem sair.

Quem tem filho talvez possa sair, dependendo da atividade profissional, Deva, inclusive. Mas os filhos permanecem em confinamento, fato. Se não priorizarmos, elencando as tarefas do dia a dia, estabelecendo uma certa rotina e organização, chegaremos ao final de tudo isso com a sensação de quero mais tempo.

Se o tempo é precioso, não devermos desperdiçar e a rotina liberta. Sim, ela liberta. Não sou das pessoas que amam rotina, mas aprendi o quanto ela me faz esticar o tempo.

As crianças, principalmente, precisam de uma rotina e de regras. E é tarefa parental definir claramente as regras, de forma clara e consistente. Regras e ordens ajudam no processo de autorregulação e monitoramento do comportamento. A criança sabe claramente o que o adulto espera dela, pois foi acertado em acordo. É tarefa parental também, supervisionar e cuidar para que a criança cumpra o combinado.

Finalizo com a reflexão que, embora importante, o desafio do momento é quanto ao absolutismo das regras. Flexibilizar para avaliar as que são desnecessárias, exaustivas ou inadequadas, porém mantendo inegociável aquelas que são deveres e acordos importantes para manter a ordem.

Priorizar é manter as rédeas do galinheiro. Afinal, não escolhemos estar nessa posição, mas podemos escolher como passaremos por tudo isso, sem penalizar a nos mesmos, muito menos os nossos filhos.

O que vamos levar desse tempo? Isso, sim, é escolha.

Adriana Amaral

15/04/2020

Comentários

  1. Relembrar esse livro da Sylvia Orthof, é como fazer uma viagem no tempo. Lembro-me deste livro lá pelos idos de 1984/85. Muito atual e pertinente para este momento o seu texto. Parabéns!
    Que possamos fazer as melhores escolhas possíveis para viver cada dia. Grata por nos lembrar disso!

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  2. Oi, querida Elis! Obrigada pela visita, tão bom compartilhar, não é mesmo? Esse livro é uma riqueza e caiu bem no momento.
    Um lindo dia para você, seja sempre bem vinda!

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