Angústia do diagnóstico,parte 2 -Desarmando os clichês


" Pai: Se ambos falássemos logicamente todo o tempo,não chegaríamos nunca a lugar algum.Somente repetiríamos os velhos clichês que todo mundo vem repetindo durante séculos.
Filha:O que é um clichê,papai?
Pai: Um clichê? É uma palavra em francês e creio que,originalmente,um termo de tipográfos.Quando imprimem uma frase,devem escolher as letras soltas e pô-las uma a uma em uma espécie de madeira acanalada para compor assim uma frase.Porém,para aquelas palavras e frases que a gente usa com frequência,o impressor conserva conjuntos de tipos compostos.E essas frases já feitas chamam-se clichês.
Filha:Mas agora esqueci o que dizias sobre os clichês,papai.
Pai: Sim,era a respeito dos embrulhos a que chegamos durante estas conversas,e como chegar a confusões tem certo sentido.Se não caíssemos em embrulhos,nossas conversas seriam como jogar rummy* sem embaralhar as cartas primeiro.
Filha:Sim,papai,mas o que acontece com essas coisas,esses conjuntos de tipos já feitos?
Pai: Os clichês? Sim,é a mesma coisa.Todos nós temos montes de frases e idéias feitas,e o impressor tem conjuntos de letras já armados,todos ordenados em frases.Porém,se o impressor quer imprimir algo novo,digamos,algo em outro idioma diferente,tem que desarmar todos os conjuntos velhos de letras.Da mesma maneira,para pensar novas idéias ou dizer coisas novas,temos que desarmar nossas idéias feitas e misturar as peças."
Gregory Bateson
*Rummy é um jogo de cartas de origem israelita.


Retirei esse texto do livro da Alicia Fernadez, que brilhantemente diz "(...)para pensar novas ideias temos que desarmar nossas ideias feitas e misturar as peças,assim como o diagnóstico ver-se-á obrigado a desarmar os clichés(...)"
Ela versa sobre o diagnóstico e de como a maioria das pessoas determinam o diagnóstico e o tratamento como algo não simultâneo.
O diagnóstico psicopedagógico se dá ao longo da própria terapia,e como falei anteriormente,o que menos preocupa é o rótulo,os clichés.
O paciente não necessita de um diagnóstico,o terapeuta necessita dele para poder intervir,ela diz no início do 1º capítulo.
"O diagnóstico para o terapeuta deve ter a mesma função que a rede para o equilibrista."
A observação,escuta atenta aos fatos, o papel do indivíduo em seu meio escolar e familiar,nos vão dando pistas para desvendar os estilos de aprendizagem e os motivos do fracasso escolar de cada um.
Os rótulos funcionam como boia salvadora,determinam o futuro cognitivo do indivíduo,acalmando a ansiedade de profissionais e educadores,mas imprimindo uma marca ao indivíduo que se mede,se examina,e pouco se escuta.
Temos sim os distúrbios,isso é fato.
Mas temos equívocos o tempo todo.
E como diz Sara Pain,"Uma tarefa primordial no diagnóstico é resgatar o amor.Em geral os terapeutas tendem a carregar nas tintas sobre o desamor,sobre o que falta e poucas vezes se evidencia o que se tem e onde o amor é resgatável.Sem dúvida,isso é que nos importa no caminho da cura."


Comentários

  1. Incrível como a sua escrita é cirúrgica, toca em pontos fulcrais. Parabéns!

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